terça-feira, 3 de março de 2015

A espetaculização da dor



A televisão aberta e "fechada" está cheia de programas dos mais variados. Porém, atualmente, um tipo de programa me parece vir fazendo bastante sucesso tanto em rede nacional, quanto nos canais internacionais: os programas de beleza.

Um quadro que compõe esses programas de beleza é justamente aquele da renovação do visual. Normalmente as emissoras/canais escolhem uma pessoa com a aparência considerada fora dos padrões (falar sobre padrão de beleza estará na minha lista para as próximas postagens).

Essas pessoas já se consideram deslocadas dentro de uma sociedade cruel, com um padrão de beleza ainda mais cruel e excludente. Atualmente, para a pessoa ser considerada "perfeita" precisa ser magra (essencial), preferencialmente branca e preferencialmente de cabelo liso.

Quem não se encaixa nessa estética acaba sendo marginalizado da sociedade e do convívio dela. Hoje, ao pegar pra assistir um desses quadros na rede nacional de televisão, vi algo absurdo.

A participante se queixava de se sentir constrangida por conta de sua aparência. Após problemas de saúde durante a gravidez, ela afirmou que a imagem ficou fragilizada. Além do sentimento de marginalização perante a sociedade por não se encaixar no padrão de beleza ditado, ela possivelmente possuía depressão, pela própria postura que sustentava.

Tudo isso, aliado à falta de condições, acaba mesmo vulnerabilizando a imagem psicológica e física que uma pessoa tem de si mesma. Porém, como oferecer emprego decente e psicólogo não dá audiência, o programa resolveu explorar uma suposta mudança de aparência da pessoa.

Antes da moça passar por toda a transformação estética, entretanto, veio a parte mais chocante desse show que expõe a dor alheia e fragiliza ainda mais uma pessoa já em situação de depressão.

Em uma das cenas, uma "psicóloga" afirma que levaram a foto da moça às ruas para que as pessoas opinassem sobre sua aparência. Como era de se esperar, palavras muito duras e que certamente a magoariam foram ditas e mostradas à participante.

"horrível", "feia demais", "acabada" etc.

Essas foram algumas das palavras que a pobre moça teve que ouvir no auge de seu constrangimento e depressão. Aí eu me pergunto: como fragilizar mais ainda uma pessoa pode ser concebido como forma de ajudá-la?

A resposta é simples: não pode. O que está por trás dessa situação não é uma tentativa de ajuda ao indivíduo deprimido e que se sente deslocado. O que está por trás é um show. É a transformação da dor alheia em espetáculo.

Tenho algumas conclusões do que essa espetaculização da dor e da intimidade alheia pode causar numa sociedade cada vez menos empática ao sofrimento alheio... Mas isso deixo pra uma outra postagem. Por ora, é bom começarmos a refletir qual a real intenção por trás desses programas aparentemente genuínos e de "boas intenções".

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